Quando o tema é concurso público, muitas das respostas sobre os direitos dos candidatos são encontradas no próprio texto constitucional. É o que acontece, por exemplo, com o tema ora em análise, cuja solução é adiantada pelo inciso IV do artigo 37 da Constituição Federal que, resumidamente, assegura, ao candidato aprovado em concurso público anterior, a prioridade em ser nomeado antes daqueles aprovados em concurso posterior:

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Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[…]

IV — durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira;

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Todavia, tendo em vista a grande repercussão social que a matéria representa, principalmente quando se refere aos candidatos aprovados em cadastro de reserva, é inegável que a construção jurisprudencial sobre o tema também possui grande ressonância na definição e aplicação do “direito à nomeação”.

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Nesse contexto, é importante relembrar que há pouco tempo, os Tribunais Superiores tinham o entendimento unânime no sentido de que o candidato aprovado em concurso público, ainda que dentro do número de vagas previstas no edital, não possuía direito à nomeação, ficando, portanto, à mercê do interesse da Administração, que poderia, ou não, prover os cargos disponibilizados no concurso público concorrido, sendo, essa regra, afastada somente no caso houvesse a comprovação cabal de que, dentro do prazo de validade do certame, teria ocorrido desrespeito à ordem de classificação dos aprovados.

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Felizmente, à luz dos preceitos trazidos pela Constituição Federal de 1988, os Tribunais passaram a rever o tratamento conferido ao direito à nomeação do candidato, evoluindo em diversos aspectos para compreender as peculiaridades de cada caso concreto levado à apreciação do Poder Judiciário e para harmonizar os interesses do candidato e os da Administração Pública.

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Com base nessa evolução, em diversos julgados, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal vêm dando uma interpretação mais ampla sobre o direito dos candidatos, afirmando que existe direito subjetivo à nomeação quando houver a comprovação de surgimento de novas vagas no prazo de validade do certame, tendo em vista a aplicação dos princípios da boa-fé, confiança, moralidade.

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Entre as decisões favoráveis ao candidato aprovado em concurso público é necessário destacar o seguinte acórdão, proferido pelo Supremo Tribunal Federal[1]:

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EMENTA: DIREITOS CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. NOMEAÇÃO DE APROVADOS EM CONCURSO PÚBLICO. EXISTÊNCIA DE VAGAS PARA CARGO PÚBLICO COM LISTA DE APROVADOS EM CONCURSO VIGENTE: DIREITO ADQUIRIDO E EXPECTATIVA DE DIREITO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. RECUSA DA ADMINISTRAÇÃO EM PROVER CARGOS VAGOS: NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO. ARTIGOS 37, INCISOS II E IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

1. Os candidatos aprovados em concurso público têm direito subjetivo à nomeação para a posse que vier a ser dada nos cargos vagos existentes ou nos que vierem a vagar no prazo de validade do concurso.

2. A recusa da Administração Pública em prover cargos vagos quando existentes candidatos aprovados em concurso público deve ser motivada, e esta motivação é suscetível de apreciação pelo Poder Judiciário. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento.

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Nesse julgamento, o Ministro Marco Aurélio já consagrava a tese do direito subjetivo à nomeação dos candidatos aprovados no certame para além das vagas inicialmente previstas em edital e, complementarmente a isso, pelo escopo constitucional da realização de concurso público, o magistrado afirmou que seria inadmissível a preterição de candidatos classificados pela nomeação dos aprovados em novo certame.

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Veja o trecho do voto, abaixo destacado:

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No prazo de validade do concurso, se ele é feito para preenchimento dos cargos já existentes, criados por lei, entendendo-se, portanto, que são necessários ao funcionamento da Administração Publica, há o direito subjetivo à nomeação. Não se pode deixar, simplesmente, escoar o prazo de validade do concurso para, depois, convocar-se um outro candidato.

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Com a evolução do entendimento dos Tribunais Superiores, a jurisprudência das demais cortes do país passaram a ser modificadas para afirmar que aquele candidato, mesmo aprovado fora do número de vagas previstas no edital, possui direito de preferência a nomeação[2]:

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AGRAVO REGIMENTAL. CONCURSO PÚBLICO. ABERTURA DE NOVO CONCURSO DENTRO DO PRAZO DE VIGÊNCIA DO ANTERIOR. DIREITO À NOMEAÇÃO POR PARTE DOS CANDIDATOS APROVADOS COMO EXCEDENTES.

1. Esta Corte tem orientado sua jurisprudência no sentido de haver direito a nomeação se, dentro do prazo de validade do concurso, outro é aberto para o mesmo cargo e ainda há candidato aprovado no concurso vigente.

2. O edital é a lei do concurso e há de ser rigorosamente observado. Respeitando-se, inclusive, o prazo estatuído em Edital de Prorrogação de validade do certame.

3. Agravo regimental da CEFET/MG improvido.

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Diante disso, conclui-se que, em que pese não haver legalidade em abrir novo edital para provimento de determinados cargos na vigência do certame anterior, surgindo novas vagas dentro do prazo de validade de ambos os concursos, aqueles candidatos aprovados em prova anterior, mesmo que em cadastro de reserva, possuem direito subjetivo à nomeação e prioridade na ordem de convocação.

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Por: Leandro Gobbo
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[1] RE 227480, Relator(a):  Min. MENEZES DIREITO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 16/09/2008, DJe-157 DIVULG 20-08-2009 PUBLIC 21-08-2009 EMENT VOL-02370-06 PP-01116 RTJ VOL-00212- PP-00537 RMP n. 44, 2012, p. 225-242

 

[2] TRF-1 – AGAMS: 6782 MG 2009.38.00.006782-0, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 19/01/2011, QUINTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.140 de 28/01/2011

Thaisi Jorge

Thaisi Jorge

Advogada na área de Direito Público. Sócia do escritório Machado Gobbo Advogados. Formada na Universidade de Brasília. Pós-graduada em Direito Contratual pela PUC-SP. Pós-graduanda em Direito Administrativo pela USP. Reconhecida no guia americano Best Lawyers 2020, 2021 e 2022 na área de Direito Administrativo. Ex-Presidente da Comissão de Fiscalização de Concursos Públicos da OAB/DF.

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