No universo dos concursos públicos, a nulidade de questões da prova por plágio é um assunto polêmico, que abre diversos debates legais e jurisprudenciais.

Princípios Constitucionais e Legais

O concurso público é pautado pelos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade. No contexto das questões de prova de concurso, a cópia integral ou a reprodução substancial de itens de outros certames pode configurar afronta a esses princípios.

O entendimento jurisprudencial destaca que a utilização de questões idênticas, sem a devida contextualização ou adaptação, pode caracterizar desrespeito ao princípio da isonomia, uma vez que alguns candidatos podem se beneficiar de conhecimento prévio das perguntas, violando, também por este motivo, a moralidade do concurso.

Já no que se refere à legalidade, a violação ocorre quando as questões plagiadas comprometem a igualdade de condições entre os concorrentes, proporcionando vantagens injustas a alguns em detrimento de outros.

A violação da legalidade em questões de concurso, notadamente por meio do plágio, compromete não apenas a integridade do certame, mas também a confiança dos participantes no processo seletivo.

Desdobramentos Jurisprudenciais

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já teve oportunidade de se deparar com matéria semelhante – nulidade de questões de concurso por plágio – e concluiu que sendo comprovada a repetição de questões já produzidas, deve-se declarar a nulidade.

RECURSO INOMINADO. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. CONCURSO PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO. SUSEPE. QUESTÃO 33 DA PROVA. QUESTÃO NÃO INÉDITA. ILEGALIDADE VERIFICADA. SENTENÇA MANTIDA. A ação objetiva a anulação da questão de número 33 da prova objetiva aplicada para provimento de cargos junto à SUSEPE Edital nº 01/2014, com a consequente soma da pontuação para os autores e seus efeitos nas demais fases do concurso. Conforme entendimento pacificado nas Turmas Recursais da Fazenda Pública, restando comprovada nos autos a repetição de questão já produzida em concurso anterior, essa deve ser anulada, em observância ao princípio da isonomia. O ineditismo é indispensável para a lisura do concurso, vez que pode beneficiar, em detrimento dos demais, candidato que tenha realizado a prova anterior onde já figurou a mesma questão. Logo, não prospera o recurso, devendo ser mantida a sentença por seus próprios fundamentos (art. 46, segunda parte, da Lei nº 9.099/95). RECURSO INOMINADO DESPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71006878615, Terceira Turma Recursal da Fazenda Pública, Turmas Recursais, Relator: José Ricardo Coutinho Silva, Julgado em 28/03/2019).(TJ-RS – Recurso Cível: 71006878615 RS, Relator: José Ricardo Coutinho Silva, Data de Julgamento: 28/03/2019, Terceira Turma Recursal da Fazenda Pública, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 11/04/2019)

O Tribunal de Justiça do Espírito Santo também já se manifestou da mesma forma sobre o tema.

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. CONCURSO PÚBLICO. PROVA OBJETIVA COM QUESTÕES IDÊNTICAS A PROVA JÁ APLICADA ANTEIORMENTE. PRINCÍPIO DA AUTOTUTELA. ANULAÇÃO DE ATOS ILEGAIS PELO PRÓPRIO PODER PÚBLICO. POSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. REEXAME NECESSÁRIO PREJUDICADO I. Estabelece a Súmula 473, do Supremo Tribunal Federal que a administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial. II. No caso sub examen a Administração tornou sem efeito a prova aplicada para Procurador Municipal, eis que 10 (dez) das 11 (onze) questões de Direito Processual Civil haviam sido plagiadas da prova de Procurador Estadual do Rio Grande do Sul. III. A repetição de grande quantidade de questões de uma prova já aplicada em outro certame afronta o princípio da isonomia, uma vez que favorece candidatos que eventualmente tenham participado do outro Concurso ou que tenham tido acesso às perguntas através de consultas à Internet. IV. Recurso conhecido e provido. Reexame Necessário julgado prejudicado. ACORDA a Egrégia Segunda Câmara Cível, em conformidade da Ata e Notas Taquigráficas da Sessão, que integram este julgado, por unanimidade de votos, conhecer e conferir provimento ao Recurso de Apelação Voluntária e julgar prejudicada a Remessa Necessária, nos termos do Voto do Eminente Desembargador Relator.(TJ-ES – APL: 00002475620128080003, Relator: NAMYR CARLOS DE SOUZA FILHO, Data de Julgamento: 23/09/2014, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 01/10/2014)

Divergência

No entanto, vale lembrar que tal entendimento não é unânime. Isso porque, para alguns Tribunais, para que seja possível anular questões de concurso por plágio, é necessário que a quantidade de questões idênticas seja significativa e não pontual, sob pena de se violar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade ao se cobrar ineditismo em todas as questões já produzidas em concurso público.

Conclusão

Em casos de concursos com questões plagiadas em grande quantidade, a nulidade pode ser arguida pelo candidato, que estará respaldado nos princípios da legalidade, moralidade e isonomia, visto que a jurisprudência consolidada reforça a importância de garantir a lisura e imparcialidade nos concursos públicos.

Assim, é importante manter a vigilância contra práticas que comprometem a integridade, transparência e a isonomia na condução do processo seletivo.

Para saber mais sobre nulidade de questões de concurso, clique aqui.

Thaisi Jorge

Thaisi Jorge

Sócia do escritório Machado Gobbo Advogados. Formada na Universidade de Brasília. Pós-graduada em Direito Contratual pela PUC-SP. Pós-graduada em Direito Administrativo pela USP. Reconhecida no guia americano Best Lawyers 2020 a 2024 na área de Direito Administrativo. Ex-Presidente da Comissão de Fiscalização de Concursos Públicos da OAB/DF.

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