Para ingresso nos quadros públicos, a Constituição da República de 1988 elegeu, como via exclusiva, o sistema meritório do concurso público. Não é por outra razão que o judiciário, inclusive o Supremo Tribunal Federal, possui entendimento sedimentado sobre a impossibilidade de que modos derivados de investidura em cargo e emprego públicos sejam admitidos na nova ordem jurídica.

.

O artigo 37, inciso II da Constituição da República é quem se encarregou da disposição sobre a necessidade de a investidura em cargo ou emprego público ser, obrigatoriamente, decorrente da prévia aprovação em concurso público de provas ou provas e títulos, ressalvada as nomeações para os cargos em comissão.

.

Todo esse cuidado constitucional com a forma de investidura em cargo ou emprego público está intimamente ligado ao escopo do concurso público, que nada mais é do que selecionar, entre todos os candidatos que concorrem em igualdade de condições, aqueles que se encontram preparados para exercer, com excelência, as atividades públicas.

.

Mas veja, para selecionar aqueles os melhores candidatos para exercerem as atividades públicas, o Estado Administrador pode, para determinado concurso público e a depender do grau da complexidade das tarefas, atribuir pontos ao histórico profissional do candidato, instituindo a realização de provas e títulos.

.

Após ter sido verificada a necessidade de realização de prova de títulos para o correto exercício de determinado cargo ou emprego público, a banca executora deve primar por realizar, corretamente, a sua delimitação de extensão no contexto do certame.

.

 Isso porque, no caos de concessão de pontos por títulos, os executores do certame devem primar pelo princípio da proporcionalidade na distribuição dos referidos pontos, para que, ao mesmo tempo em que se reconheçam formações e experiências relevantes para o correto das atividades pertinentes ao cargo ou emprego público, não seja esse o único condicionante para que o candidato logre êxito no certame.

.

Ora, evidente que a prova de títulos possui um caráter complementar, subalterno das provas ordinariamente aplicadas em concursos públicos. Nesse contexto, sabendo-se que a Constituição da República homenageou a impessoalidade, a moralidade e a eficiência para selecionar os seus servidores, caso a banca executora permitisse apontar o sucesso dos candidatos por mera aferição de sua bagagem profissional, violaria o escopo do concurso público, privilegiando-se determinado grupo em detrimento daqueles, em regra, mais jovens e que não possuem a experiência profissional para obter aprovação nessa fase do certame.

.

Nesse sentido, alguns renomados juristas já escreveram[1]:

.

[…] o concurso de provas e títulos, se observarmos com lógica e coerência o intento constitucional, indica que os candidatos devem ter seus conhecimento medido pelas provas a que se submeterem, porque esse é o objetivos delas.

.

[…] a titulação dos candidatos não pode servir como parâmetro para a aprovação ou reprovação no concurso público, pena de serem prejudicados seriamente aqueles que, contrariamente a outros candidatos, e às vezes por estarem em início de profissão, ainda não tenham tido a oportunidade de obterem esta ou aquela titulação. Entendemos, pois, que os pontos atribuídos à prova de títulos só podem refletir-se na classificação dos candidatos e não em sua aprovação ou reprovação. Só assim é possível considerar o concurso de provas e títulos  compatível com o princípio da impessoalidade inscrito no art. 37 da CF.

.

Outro não é o entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal[2] a respeito da matéria:

.

CONCURSO PÚBLICO — TÍTULOS — REPROVAÇÃO. Coaduna-se com o princípio da  razoabilidade constitucional conclusão sobre a circunstância de a pontuação  dos títulos apenas servir à classificação do candidato, jamais definindo  aprovação ou reprovação. Alcance emprestado por Tribunal de Justiça à  legislação estadual, em tudo harmônico com o princípio da razoabilidade,  não se podendo cogitar de menosprezo aos critérios da moralidade e da  impessoalidade.

.

Evidente, portanto, que a banca examinadora, ao atribuir a valoração dos títulos, deverá distribuir os pontos a eles atinentes de modo que, ao mesmo tempo que prioriza a formação profissional e intelectual do candidato, não tome esta fase do certame como elemento condicional de aprovação ou desaprovação de candidatos, sob pena de violar os princípios norteadores do próprio concurso, regra constitucional inafestável para o provimento de cargos e empregos públicos.

.
Por: Leandro Gobbo
.


[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 19 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 512.

.

[2] STF, AI n. 194.188 AgR/RS, Relator Ministro Marco Aurélio, j.  em 30/03/98, DJ de 15/05/1998, p. 48.

Thaisi Jorge

Thaisi Jorge

Sócia do escritório Machado Gobbo Advogados. Formada na Universidade de Brasília. Pós-graduada em Direito Contratual pela PUC-SP. Pós-graduada em Direito Administrativo pela USP. Reconhecida no guia americano Best Lawyers 2020 a 2024 na área de Direito Administrativo. Ex-Presidente da Comissão de Fiscalização de Concursos Públicos da OAB/DF.

Deixar um Comentário