A imposição de limite de idade máximo para a inscrição em concursos como os das Polícias Civil, Militar e Federal, além dos Bombeiros sempre gera debates.

De um lado, os candidatos alegam que a Constituição Federal não permite a restrição aos cargos públicos, sendo que o limite de idade consistiria em uma discriminação. Do outro lado, a Administração Pública (ente público que promove o concurso ou a própria banca organizadora) alega que para o exercício de determinadas funções, é essencial que o candidato tenha vigor físico.

Mas será que o limite de idade para determinados cargos é legal?

1) Constitucionalidade do limite de idade 

A discussão, antiga, chegou ao Supremo Tribunal Federal, que pacificou o entendimento de que alguns cargos podem exigir que o candidato se enquadre dentro de uma faixa etária, obedecendo os limites mínimo e máximo impostos, tendo em vista as atribuições  que serão desempenhadas em razão do cargo concorrido.

Por esse motivo, foi elaborada a Súmula 683/STF, que assim diz: o limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.

Estando pacífico que o Poder Judiciário entende como válida a restrição de idade para a inscrição em concurso público ou exercício de determinado cargo, cabe, agora, identificar quais são os pré-requisitos necessários para que tal limitação seja considerada legal.

2) Requisitos para a validade do limite de idade

  • Existência de lei formal determinando a restrição de idade para a inscrição no concurso ou para o exercício do cargo.

O candidato deve verificar na Lei que regulamenta o cargo para o qual pretende concorrer a exata redação da restrição sobre o limite de idade.

Caso a Lei não imponha limite de idade para o  ingresso na carreira, para a  matrícula no curso de formação ou, até mesmo, para a inscrição no concurso público, a restrição etária feita pelo edital será inválida e o candidato poderá concorrer ao cargo.

  • Natureza do cargo

O segundo requisito é decorrente da própria Súmula do STF que há pouco citamos: é preciso que o limite de idade se justifique de acordo com as atribuições do cargo.

Em decorrência disso, muitos Tribunais estão retirando os limites de idade impostos para candidatos que pretendem exercer o cargo de escrivão, de agentes de saúde ou outro cargo de natureza burocrática e não tipicamente militar, que possui atribuições diversas daquelas previstas para cargos de soldado, policiais, bombeiros[1].

  • Isonomia

O terceiro requisito diz respeito à isonomia: todos os candidatos que concorrem para um mesmo cargo devem observar o mesmo limite de idade.

Em alguns casos, a Lei do cargo impõe diferentes idades aos candidatos civis e aqueles que já são da corporação.

Ocorre que embora a Constituição Federal tenha concedido a possibilidade de, em razão da natureza do cargo, limitar a idade para o ingresso na carreira, não permitiu qualquer outra discriminação de fundo subjetivo diferenciando grupos de candidatos civis e militares. Assim, se o limite de idade não é observado para os candidatos da corporação, não pode ser aplicado exclusivamente para o candidato civil, sob pena de violação à isonomia.

Nesse sentido, vale conferir os seguintes precedentes:

ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. CONCURSO PÚBLICO. BOMBEIRO MILITAR. LIMITE DE IDADE. Constitui discriminação inconstitucional o critério utilizado pela administração quando fixou limites diferentes de idade para o candidato civil e para aqueles que já são militares. Precedente. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 586088 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 26/05/2009, DJe-113 DIVULG 18-06-2009 PUBLIC 19-06-2009 EMENT VOL-02365-07 PP-01382 RT v. 98, n. 887, 2009, p. 170-172) CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. CONCURSO PÚBLICO. MÉDICO MILITAR. LIMITE DE IDADE. 1. O recorrido, aprovado em concurso público para Primeiro Tenente Médico Policial Militar do Quadro de Oficiais de Saúde do Estado de São Paulo, não pôde ser empossado, sob o argumento de que, na época da inscrição para o certame, tinha mais de 35 anos de idade. 2. Edital que fixou idade máxima, em concurso para médico militar, apenas para inscrição de candidatos civis. A Corte de origem afastou essa diferenciação e determinou a posse do recorrido. 3. Se o bom desempenho das atividades de médico da Polícia Militar demanda a força física peculiar ao jovem, a exigência de 35 anos de idade máxima deveria ser atribuída a todo e qualquer candidato e não apenas aos civis. Fica claro que a distinção em debate foi criada para favorecer os militares. Precedente: RMS 21.046. 4. Agravo regimental improvido.
(STF RE 215988 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 18/10/2005, DJ 18-11-2005 PP-00019 EMENT VOL-02214-02 PP00320 RNDJ v. 6, n. 74, 2006, p. 57-59)”
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. CONCURSO PÚBLICO. BOMBEIRO MILITAR. LIMITE DE IDADE. Constitui discriminação inconstitucional o critério utilizado pela administração quando fixou limites diferentes de idade para o candidato civil e para aqueles que já são militares. Precedente. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 586088 AgR, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 26/05/2009, DJe-113 DIVULG 18-06-2009 PUBLIC 19-06-2009 EMENT VOL-02365-07 PP-01382 RT v. 98, n. 887, 2009, p. 170-172)
DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. REEXAME NECESSÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO. SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO CEARÁ E DO CORPO DE BOMBEIRO MILITAR. LIMITE DE IDADE DIFERENCIADO PARA CANDIDATOS CIVIS E MILITARES. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO COLENDO STF. APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDOS E DESPROVIDOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido da possibilidade de exigência de limite de idade para ingresso, na carreira militar, em face das peculiaridades da atividade exercida, desde que haja previsão em Lei específica e no edital do concurso público. Precedentes: STJ, RMS 44.127/ac, Rel. Ministro Humberto Martins, segunda turma, dje de 03/02/2014; STJ, AGRG no RMS 41.515/ba, Rel. Ministro herman benjamin, segunda turma, dje de 10/05/2013. 2. No presente caso, contudo, constata-se uma grande disparidade entre o limite de idade previsto nos Editais para o candidato civil e o militar, de maneira que tal requisito não encontra respaldo na Constituição Federal de 1988, em razão de seus arts. 5º, caput, e 7º, inciso XXX. 3. Ainda que norma legal exista impondo tal restrição etária, esta não se enquadraria no conteúdo jurídico constitucional do princípio da razoabilidade. 4. Dessarte, vislumbra-se inconstitucional a diferenciação realizada pelos editais, os quais fixaram limites de idade diferenciados para candidatos civis e militares, favorecendo imotivadamente os candidatos militares e, em consequência, ferindo, o princípio da isonomia, conforme precedentes desta Corte e do colendo Supremo Tribunal de Federal. 5. Apelação Cível e Reexame Necessário conhecidos e desprovidos ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do presente recurso, mas para negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, 22 de julho de 2015 DESEMBARGADOR FRANCISCO SALES NETO Presidente do Órgão Julgador / Relator PROCURADOR(A) DE JUSTIÇA
(TJCE Relator (a): FRANCISCO SALES NETO; Comarca: Fortaleza; Órgão julgador: 7ª Vara da Fazenda Pública; Data do julgamento: 22/07/2015; Data de registro: 22/07/2015)
Assim, casos em que a Lei do cargo atribuiu limites de idade diferentes para os candidatos que já fazem parte da corporação são entendidos, pelo Poder Judiciário, como discriminatórios e a consequência disso é determinar que o candidato, injustamente vetado para a participação no certame, possa concorrer, mesmo superando o limite de idade imposto pela Lei e pelo edital[2].

[1] AI 720259 AgR, Relator(a):  Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, DJE 28-04-2011, p.348;

[2] STF, RE 215988 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 18/10/2005, DJ 18-11-2005 PP-00019 EMENT VOL-02214-02 PP-00320 RNDJ v. 6, n. 74, 2006, p. 57-59;

[3] TRF1, AG 0031494-68.2007.4.01.0000 / PI, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, SEXTA TURMA, DJ p.202 de 21/01/2008.

Thaisi Jorge

Thaisi Jorge

Sócia do escritório Machado Gobbo Advogados. Formada na Universidade de Brasília. Pós-graduada em Direito Contratual pela PUC-SP. Pós-graduada em Direito Administrativo pela USP. Reconhecida no guia americano Best Lawyers 2020 a 2024 na área de Direito Administrativo. Ex-Presidente da Comissão de Fiscalização de Concursos Públicos da OAB/DF.

Deixar um Comentário