Para abordar a possibilidade de um aposentado do INSS ingressar nos quadros da Administração Pública, por meio de concurso público, será necessário entender dois pontos que fazem referência à Constituição Federal: o primeiro deles versa sobre a normatização do sistema previdenciário brasileiro; já o segundo diz respeito às vedações e permissões referentes ao acúmulo de cargos e empregos públicos.
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O sistema previdenciário brasileiro é composto por dois regimes diversos, regulamentados por legislações distintas. O primeiro deles é o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), disciplinado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e regulado pelo artigo 201 da Constituição Federal. Esse sistema é próprio dos trabalhadores da iniciativa privada, empregados públicos, servidores detentores de cargos em comissão, servidores temporários e dos detentores de cargo efetivo, quando os entes tenham optado pela vinculação ao Regime Geral.
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O segundo é o Regime Próprio de Previdência social, regido pelo artigo 40 da Constituição Federal, e diz respeito ao regime dos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados dos Municípios e do Distrito Federal.
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Essa diferenciação é importante, pois, para cada um dos regimes, as regras sobre a possibilidade de cumulação de proventos de aposentadoria com a remuneração de novo cargo ou emprego público são alteradas. Por isso, para os fins deste artigo, destacamos que estamos tratando, com exclusividade, do cidadão aposentado pelo Regime Próprio da Previdência Social (INSS) que deseja ingressar na Administração Pública mediante a realização de concurso público.
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Esclarecidas as diferenças entre os regimes do Sistema Previdenciário Brasileiro, destacamos que a cumulação de cargos, empregos e funções públicas é regulada pelo artigo 37, incisos XVI e XVII, da Constituição Federal[1]. Esses dispositivos determinam, como regra geral, a sua vedação[2].
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Em complemento a essas normas, o §10 do mesmo artigo constitucional veda, expressamente, a percepção acumulada de proventos de aposentadoria decorrentes ora do artigo 40 (regime próprio dos servidores titulares de cargo efetivo), ora do artigo 42 (regime dos membros das Polícias e do Corpo de Bombeiros Militares), ora do artigo 142 (regime dos membros das Forças Armadas) com a remuneração de outros cargos, empregos ou funções públicas, ressalvadas as exceções previstas na Constituição Federal.
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Adicionalmente, as vedações constantes no artigo 37, §10 da Constituição Federal[3], em nenhum momento, fazem referência àqueles cidadãos submetidos ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), regulado pelo INSS. Daí decorre que, na ausência de vedação expressa, é possível considerar como lícita a cumulação dos proventos de aposentadoria concedida pelo Regime Geral de Previdência Social com a remuneração do novo cargo ou emprego público.
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Aliás, para reforçar os argumentos aqui apresentados, destacamos que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao examinar essa matéria, já entendeu que a vedação, pelo o edital, da inscrição de candidato aposentado pelo INSS cria um obstáculo inconstitucional, pois afronta a norma que regula a cumulação de cargos e proventos[4].
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Dessa forma, pela leitura atenta dos dispositivos constitucionais mencionados e pela jurisprudência destacada, fica comprovado que, caso um candidato aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS), após a sua aposentadoria, ingresse na Administração Pública mediante concurso público, será possível o recebimento dos proventos de aposentadoria, devidos pelo INSS, cumulados com a remuneração do novo cargo ou emprego.
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Por Kauê Machado
[1] CF, Art. 37 […]
XVI — é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI.
a) a de dois cargos de professor;
b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico;
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;
XVII — a proibição de acumular estende-se a empregos e funções e abrange autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público.
[2] Tal regra apenas é afastada em casos de ocupação de dois cargos de professor, ou ocupação de um cargo de professor com outra função técnica ou científica ou, ainda, dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas.
[3] CF, Art.37, § 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.
[4] TJMG, 7ª Câmara Cível. Apelação Cível n. 1.0000.00.301478-4/000, Relator: Des. Wander Marotta, data do julgamento: 24 fev. 2003.
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